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Vamos falar sobre autismo?

Em março de 2023 o CDC (Center of Deseases Control and Prevention) lançou documento que mostra que 1 em cada 36 crianças de 8 anos foram identificadas com TEA nos EUA no ano de 2020.

Esses números demonstram que a prevalência de pessoas com TEA está a aumentar, progressivamente, ao longo dos anos, já que em 2004 o número divulgado pelo CDC era de 1 a cada 166. Em 2012, era 1 para 88; em 2018, passou a 1 em 59.

Mas o que é o Transtorno do Espectro Autista? “O transtorno do espectro autista (TEA) é um distúrbio do neurodesenvolvimento caracterizado por desenvolvimento atípico, manifestações comportamentais, déficits na comunicação e na interação social, padrões de comportamentos repetitivos e estereotipados, podendo apresentar um repertório restrito de interesses e atividades”.  Esse é o “conceito” que consta no site do Ministério da Saúde e que, para um texto informativo como esse, pode ser útil.

O diagnóstico nem sempre (na maioria das vezes não é) simples. Comumente, os primeiros “sinais” são notados pelos pais, familiares e professores. A demora da família em procurar atendimento médico especializado anda de mãos dadas com o preconceito e com a negação, o que posterga o início do tratamento que é complexo, e pode envolver medicações e terapias multidisciplinares.

Não há apenas “um tipo de autismo”. O espectro é bastante largo e pode variar desde o Transtorno Desintegrativo da Infância, condição em que a criança sofre uma regressão que pode resultar na perda das habilidades intelectuais, linguísticas, motoras e sociais, até os graus “mais leves”, em que o indivíduo apresenta (ou pode apresentar) dificuldades de interação social, dificuldades com organização e troca de ambientes, inquietude e outros sintomas, mas no geral não apresentam déficit cognitivo.

Atualmente, existem três níveis de suporte. O nível 1 é o que está descrito acima como “grau mais leve”. No nível 2, as dificuldades de comunicação gestual e verbal, bem como a integração social são bem mais comprometidas. Pode haver estereotipia (repetições e rituais que podem ser linguísticos, motores e até de postura) e grande dificuldade em mudar o foco de suas ações. Já no nível 3, há sério comprometimento na comunicação verbal e não verbal, bem como grandes dificuldades em realizar atividades corriqueiras, inclusive as fisiológicas, ainda que com apoio.  Nesse nível de suporte, o indivíduo, regra geral, é bem mais inflexível, inclusive com a troca de rotina, pode apresentar frequentes crises de ansiedade e até mesmo comportamentos agressivos.

A despeito de tais níveis de suporte, categorizar a condição do autista em “planos” é tarefa bastante penosa e, talvez, imprecisa, servindo mais como indicativo de parâmetro do que como sentença definitiva. Não é raro que “características típicas” de um nível de suporte se apresente em outro. Além disso, o indivíduo com TEA pode apresentar comorbidades, como o TDAH, o Transtorno do Processamento Sensorial, ansiedade, depressão, epilepsia, seletividade alimentar e outras condições ou patologias, o que torna o diagnóstico –  e o próprio tratamento – ainda mais dificultoso.

Feito esse brevíssimo apanhado, e posto que a prevalência de pessoas com TEA é cada vez maior, é preciso indagar quais são os principais direitos dessas pessoas, bem assim onde estão seus maiores obstáculos.

O Transtorno do Espectro Autista, TEA, está enquadrado no Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015). Além do Estatuto, as pessoas com Transtorno do Espectro Autista também estão amparadas pela Lei 12.764/2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, que lhes assegura diversos direitos, dentre eles, o atendimento prioritário nos sistemas de saúde pública e privada, o que inclui o diagnóstico precoce, ainda que não definitivo, o atendimento multiprofissional, a nutrição adequada e os medicamentos.

Embora seja comumente desrespeitado pelas redes pública e privada de educação, em casos de comprovada necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino regular, terá direito a acompanhante especializado.

A Lei n. 13.977/20 criou a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Trata-se de lei federal, ou seja, com cogência em todo o território nacional. O documento visa dar o acesso a direitos básicos e essenciais e contribui com o planejamento de políticas públicas.

Existem ainda outros diplomas legislativos federais, estaduais e municipais que conferem direitos às pessoas com TEA.

Infelizmente, é cada vez maior o número de demandas judiciais que buscam a garantia e a prestação efetiva dos direitos previstos em lei, notadamente em face dos planos de saúde que, costumeiramente, criam entraves para o custeio dos tratamentos médicos e multidisciplinares dos pacientes. Igualmente, o Poder Público que deveria assegurar a execução do disposto em lei, tem se mostrado omisso em muitos aspectos, como por exemplo na oferta de monitores especializados para alunos com TEA e também na entrega de um tratamento adequado e célere por meio do Sistema Único de Saúde.

Em razão de tantas lacunas, famílias atípicas têm se organizado em associações ou mesmo em grupos que visam fomentar a inclusão das pessoas com TEA, além de informar a respeito do transtorno como forma de mitigar o preconceito que ainda é muito presente na sociedade.

Autismo não tem cara, não é um rótulo, não é uma doença. Autismo “não pega”, e é somente por meio da informação e da conscientização de todos e de todas que a dignidade das pessoas com TEA e de seus familiares poderá ser alcançada.

Rodrigo Paixão Pereira (Advogado e Juiz Leigo. Professor do Curso de Direito da Faculdade Anhanguera do Rio Grande. Pós graduado em Direito Público; Direito e Tecnologia e Neuropsicologia. Pai atípico e militante pela inclusão das pessoas com TEA)

Foto: Freepik

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