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Biografias ordinárias: Maicon

Conheci Maicon num verão, no campo de futebol da Cohab 2 (Rio Grande /RS). De chegada, me deu dois tapas e levou minha bola.

Maicon falava se babando e tinha uma franja que cobria os olhos, gritava com todo mundo e batia até no Batata, que era meio que o dono do campinho.

Sabe-se lá de onde veio, sei que era primo de um dos guris do Pirâmide, time de futebol do bairro. Em poucos meses, o tal Maicon já era o terror da área e tentou bater até na minha mãe. Ninguém podia com ele. Grande não era, mas tinha uma coragem de Aquiles, uma voz grave demais para a idade e uma definição muscular de jovem trabalhador da construção civil.

O campo da Cohab 2 era só areia e dunas naquele tempo. E num desses dias vadios dos anos noventa, Maicon violentou um garotinho de apelido Maradona. Dizem que foi atrás de uma duna, em plena luz do dia. Ninguém pode ajudar, e quem podia riu muito do Maradona.

Por fim, Maicon entrou para o crime e na primeira invasão a domicílio, levou um tiro no quadril. A sequência é presumível: imobilidade, desemprego, crack e desaparecimento. Tanto que o biógrafo não fez questão de trocar o nome do biografado.

Há negrumes inenarráveis na memória de quem foi jovem nos anos noventa. Se há.

Autor: Rody Cáceres

Foto: Pixabay

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