Inspira

Blues Além

Johnny subiu no trem que manobrava no pátio. As únicas coisas que ele trazia consigo era uma bolsa esfarrapada e seu violão. A primeira corda estava arrebentada e dentro do saco de trapos que ele chamava de bolsa, carregava toda a sorte de papéis, desde sacos até páginas rasgadas dos jornais, lápis quebrados e uma caneta.

Ele sentou e se recostou em um enorme saco de batatas. Já que era um trem de carga, ele duvidava que alguém iria até aquele vagão durante a viagem, assim, sacou o violão e começou a fazer um som sair daquelas cinco cordas. “Meu pau com cordas”, ele costumava chamá-lo. Sentindo o trem sacudir, ele se concentrou na sua música e transformou o sacolejar em ginga. Deu melodia com seu pedaço de pau encordado e, dessa forma, nascia sua nova música.

Abriu a bolsa e catou uma “folha” de papel e qualquer coisa com que pudesse escrever. Enquanto ele murmurava a melodia, riscava e rabiscava antes que ela se perdesse por entre os sacos de batatas e vazasse para o lado de fora, fugindo para a natureza para nunca mais voltar.

Depois das notas, era vez da letra. Então, ele lembrou de tudo que seu finado mestre lhe ensinara, mesmo sem jamais terem visto a cara do outro. “O poeta morto”, como Johnny o chamava.

“O truque é deixar pra lá. Deixe sair e deixe-a pra lá. Não é como se tu tivesse feito uma filha.”

E assim ele fez.

E ela era linda.

Autor: Pedro Porciúncula – Inspira

Foto: Pixabay

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